sábado, 19 de abril de 2008

A porta fechada

Fala-me daquela instituição, mas escuto-o falando de todas, diz-me que os jovens à sua guarda se portam mal, que desconhecem o respeito, apenas o medo os faz vacilar, que não são capazes de construir uma relação na base da gratuitidade, que tudo se resume ao interesse, a um abalanço de risco e ganho, de limites abolidos, de liberdades conquistadas em força de grupo, como manada em estampido.

Como não consegue nada deles em grupo, e apenas lhes chega individualmente, de forma efémera e inconsistente.

Fala-me das dificuldades em angariar fundos, das verbas escassas da Segurança Social, de como as empresas apenas contribuem para as duas ou três instituições, sempre presentes na TV, nos telejornais, com as suas caras mediáticas e as vedetas que as apoiam. De como precisavam de angariar uma vedeta para os apoiar, se esta conseguisse passar a provação de ir lá a casa almoçar com os moços…
Estes são os filhos do povo mais desgraçado, das prostitutas, dos que caíram na droga, dos marginais. São os filhos da nossa modernidade, que sustentamos sem ver, sem querer ver, mas que estão presentes nas nossas escolas, nos centros comerciais, nos transportes públicos e na nossa velhice (onde seremos mais um dos empecilhos que eles empurram para o lado, passando por cima se for o caso).

Fala-me de como não podem recorrer à violência, a castigá-los, de como na escola também não são castigados. Os mais velhos ficam a dormir até tarde, faltam às aulas sem chumbar ou serem expulsos, de como invadem a cozinha fora de horas em busca de comida, de como sente que não os está a ajudar.

É uma porta fechada. Um fim de linha sem projecto de vida sustentável. Por vezes, a mais fechada das portas é um convite aberto, um desafio, não por nós, mas pelos outros. Quando estive muito doente, nos meus “delírios”, um dia surgiram-me três portas fechadas, cabia-me abrir uma delas… revivo esse momento, agora simplificado, reduzido a uma única porta fechada.

6 comentários:

erute disse...

Dura realidade... vou continuando a rezar, para que essa realidade acabe e para que se consigam "construir" Homens e Mulheres com valores, mais qualidade e mais quantidade, para a nossa sociedade.

Fá menor disse...

Um post profundo. A merecer ser relido e comentado com mais tempo. Voltarei!

Maria João disse...

Rezo por essa situação. Não é mesmo fácil vermos pessoas à nossa volta a precisarem de ajuda e ela não chegar, principalmente quando se trata de jovens e crianças...

beijos em Cristo e Maria

Fá menor disse...

As portas fechadas não são mais do que falta de amor.

A chave que abre a porta tem de ser o amor que damos.

Como é que essas crianças não hão-de ser problemáticas se lhes falta o essencial, o amor de uma família a sério.
Além disso, falta-lhes o apoio económico - " em casa onde não há pão todos ralham e ninguém tem razão". E se não há pão, o que é isso se nãoa falta de amor por parte da sociedade? Não temos nós todos culpa?
e o tamanho da culpa de cada membro da sociedade tem relação directa com o número (e qualidade) dos "talentos" que cada um recebeu e que tem que pôr arender ao serviço dos outros, e não põe. Cada pessoa é proporcionalmente culpada consoante o que pode fazer pelo seu próximo e não faz, só se preocupando com o que a si diga respeito. é duplamente ou mais culpada quando para além de nada fazer para bem dos outros, ainda é causadora directa ou indirecta dos seus males, ao atentar contra a natureza (ambiente) e a humanidade (fazendo os outros escravos de vícios e/ou dos outros homens)
Se é toda a falta de amor que fecha a porta, mantendo uns de um lado e outros do outro (qual muro ou barreira9, só o amor a abrirá, libertando uns e outros.
e o amor manifesta-se de muitos modos conforme o que cada um tiver para dar.
Resta que cada pessoa descubra em si quais os talentos que tem que pô a render.
Será que estarei muito errada ao pensar assim?

Bjinhos

antonio disse...

Não Fá, não estás longe da realidade, mas mesmo nas familias, onde supostamente não falta amor, existe este tipo de comportamentos. Julgo que existe aqui uma crise de valores, onde tudo se relaciona na base do interesse, pressão e chantagem.

Obrigado pelo comentário/apoio.

Fá menor disse...

Amigo,
acho que se lher dermos amor, se não lhes faltarmos com uma boa educação, acompanhamento, exemplos, sobretudo os exemplos... eles serão sempre boas pessoas, com valores.
Além de tudo o que quero para os meus filhos é que sejam boas pessoas. E isso eu tenho a certeza que são!
Poderão vacilar aqui ou ali, mas o essencial está lá, o amor!

Bons feriados!